sábado, 4 de setembro de 2010

Tráfico de entorpecentes e conversão de pena


Canal do STF, no Youtube

           
            Nesta semana, o Supremo Tribunal Federal manifestou-se, em vias de controle difuso, pela inconstitucionalidade do art. 33, §4º e art. 44, ambos da Lei de Drogas (Lei nº. 11.343/06), no que se refere à vedação à conversão da pena em restritiva de direitos. Assentou-se, assim, que nos casos em que a conduta do indivíduo se insere na causa especial de diminuição de pena inscrita no art. 33, §4º, da referida lei, por muitos denominado de tráfico privilegiado, a mencionada vedação não se mostra condizente com o princípio da individualização da pena (art. 5º, XLVI, da CR/88).
            O princípio da proporcionalidade, panaceia cada vez mais utilizada no cenário jurídico brasileiro, ora adequadamente, ora nem tanto, tem se mostrado como ferramenta hábil à solução de determinados casos, mormente dos denominados hard cases (se é que importa, realmente, tal denominação[1]).
            Como desdobramento de tal princípio, pode-se extrair a regra da proibição da proteção deficiente (üntermassverbot), utilizada pela Corte Constitucional alemã[2]. Assim, com relação a determinados bens jurídicos, mormente penais, o constituinte, ao buscar garantir aqueles mais importantes ao convívio social, impõe que os Poderes da República também busquem sua efetiva garantia.
            Assim, não resta dúvida de que o constituinte teve por intenção conferir tratamento mais severo ao delito de tráfico (art. 5º, XLIII). Todavia, o legislador ao inserir na Lei de Drogas a já mencionada causa especial de diminuição de pena, possibilitando que a sanção alcance a zona dos crimes de menor potencial ofensivo, já demonstrou certa deficiência na proteção do bem jurídico indicado pela própria Lei Fundamental.
            De modo semelhante, parece notório que o STF, olvidando da faceta positiva do garantismo penal, caminha na mesma intenção do legislador, ao considerar inconstitucional a vedação à conversão da pena restritiva de liberdade. Logo, cabe a pergunta: o STF, a quem cabe a guarda da Constituição, não deveria seguir o caminho proposto pelo constituinte de 1988, que optou literalmente pela maior punição ao crime tráfico ilícito de entorpecentes?



[1] Conferir, a esse respeito: Capítulo 10, “A indevida distinção estrutural entre easy cases e hard cases e as consequências hermenêuticas”, in STRECK, Lenio Luiz. Verdade e consenso: constituição, hermenêutica e teorias discursivas. Da possibilidade à necessidade de respostas corretas em direito. 3. ed. Rio de Janeiro, Lumen Juris, 2009.
[2] Sobre a recepção brasileira da doutrina constitucional alemã, ver SILVA, Virgílio Afonso da. Interpretação constitucional e sincretismo metodológico. In Interpretação Constitucional. Organizador: Virgílio Afonso da Silva. São Paulo: Malheiros, 2005.

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